A indelével beleza do jardim tropical

Na mística Lagoa Santa, um simples jardim revela mistérios da ecologia ...

Marcos Rodrigues, estudioso de aves da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), em seu livro O equinócio dos sabiás: aventura científica no seu jardim tropical (Editora UFPR, 2018), abre as portas do seu jardim de 1.500 metros quadrados, situado na cidade de Lagoa Santa, região metropolitana de Belo Horizonte.

Entrada para o Brasil profundo de Euclides da Cunha, a região é também local de sítios arqueológicos e paleontológicos, descobertos pela exploração de grutas e cavernas iniciada pelo dinamarquês Peter Wilhelm Lund no século XIX, cujos achados inspiraram Charles Darwin na concepção da Teoria da Evolução.

Neste cenário mítico, santuário de cientistas das ciências naturais, e ponto de encontro entre dois importantes biomas brasileiros, a Mata Atlântica e o Cerrado, Rodrigues encontra no seu jardim a fonte de inspiração para retratar de forma leve temas caros à disciplina de ecologia. Ao longo do ano, a passagem gradual e silenciosa das quatro estações marca as 41 crônicas do livro, ora em forma de diário, ora de manual de “observação, contemplação e iluminação (no sentido de gerar ideias)”. O autor nos convida a uma jornada de exploração dos nossos quatro sentidos – visão, olfato, paladar e tato – pela exuberante natureza ao nosso redor.

É majestoso o que nos rodeia – no seio dos espaços palpita coruscante o grande motor da vida; envolta na clâmide cintilante do dia, a natureza ergue-se brilhante e sonora numa expansão sublime de canções, auroras e perfumes…

Euclides da Cunha

Mesmo nos centros urbanos é possível admirar a floração intensa de ipês e flamboyantes; escutar o canto de pássaros, a revoada de maritacas ou a algazarra de cigarras no entardecer; saborear frutos colhidos direto dos pés de uma mangueira ou jabuticabeira; e sentir na pele os raios de sol delicados do outono ou a secura do inverno. Até em um simples vaso de flores se esconde um universo, onde podemos contemplar os ciclos da vida, além de uma infinita rede de relações entre organismos distintos.

No amplo quintal do autor, a vegetação de espécies nativas e exóticas abriga uma enorme diversidade de fauna, dos temidos insetos pragas (como, cupins e lagartas) até as mais belas aves (como, os tucanos e beija-flores), incluindo sua fiel escudeira, Mona Lisa, uma simpática vira-lata. Entre os animais, as aves aparecem em maior frequência, com destaque para o corriqueiro sabiá. Os sabiás são resilientes, prolíficos e comumente considerados dispersores de sementes em áreas degradadas e urbanas. No final das contas é o canto dos sabiás que nos chama para observar os movimentos e a dinâmica da natureza, e com eles aprendemos a preservar a nossa biodiversidade.

O equinócio dos sabiás: aventura científica no seu jardim tropical
Marcos Rodrigues
Editora UFPR
Brasil, 2018

Crédito imagem de capa: Mathias M. Pires, sabiá-laranjeira (Turdus rufiventris).

Conteúdo publicado na revista eletrônica Ciência e Cultura (ISSN 2317-6660), volume 71, número 3, julho-setembro, 2019.


Camila Cunha

Engenheira agrônoma pela Universidade de São Paulo, doutora em genética e biologia molecular (genética e melhoramento vegetal) e especialista em jornalismo científico pela Universidade de Campinas. Atualmente é bolsista "Paulo Pinheiro de Andrade" no Instituto Weizmann de Ciências em Israel.

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